Memória da Imprensa
A imprensa que fez história, presente no Arquivo Público do Estado de São Paulo

Pseudônimos

Suzana Flag

Suzana Flag foi um pseudônimo que Nelson Rodrigues criou em 1944 para poder escrever o folhetim “Meu destino é pecar”, em O Jornal, veículo dos Diários Associados. O autor, já consagrado pela peça Vestido de Noiva, não queria ser conhecido como folhetinista e concordava que seria mais interessante para o público ler algo escrito por uma autora com sobrenome estrangeiro. Assim, ao invés de comprar um folhetim importado, Freddy Chateaubriand, diretor de O Jornal, deu aval para Nelson criar.

As histórias de Suzana Flag fizeram tanto sucesso que em pouco tempo a novelista passou a ser publicada em todos os jornais de Assis Chateaubriand[1]CASTRO, Ruy. O Anjo Pornográfico. São Paulo: Cia. das Letras, 2010. p. 187.. Além de “Meu destino é pecar”, Suzana escreveu um segundo folhetim chamado “Escravas do Amor” e, em 1946, sua autobiografia, com um enredo mirabolante, sob o título “Minha Vida”, publicada em capítulos na revista A Cigarra[2]CASTRO, Ruy. O Anjo Pornográfico. São Paulo: Cia. das Letras, 2010. p. 187..

Alguns anos depois, Suzana Flag assinava uma coluna sob o título Sua lágrima de amor, no mesmo jornal, para responder às dúvidas amorosas das leitoras. De acordo com o que Ruy Castro descreve na biografia O Anjo Pornográfico,

“O segredo de ‘Suzana Flag’ era essa estranha química, de suas histórias serem escritas por um homem, mas com uma cabeça tão ‘sensível’ e ‘feminina’. A outra chave para o sucesso de ‘Suzana Flag’ era que, nos folhetins, Nelson podia escrever exatamente o que pensava. Sua famosa frase, ‘Todo amor é eterno. Se não é eterno, não era amor’, por exemplo, foi dita pela primeira vez em ‘Meu destino é pecar’.”[3]CASTRO, Ruy. O Anjo Pornográfico. São Paulo: Cia. das Letras, 2010. p. 208.

O primeiro texto selecionado traz o início do romance autobiográfico Minha Vida, que Nelson – ou melhor, Suzana Flag – escreveu em 1946 para a revista A Cigarra. Veja os capítulos publicados na edição de julho daquele ano. Páginas 34 a 42 e 141 a 145 do PDF.

Em suas memórias, Nelson diria:

“A Suzana Flag teve o descaramento de escrever a própria biografia, que foi publicada n’A Cigarra”.[4]RODRIGUES, Sonia (Org.). Nelson Rodrigues por ele mesmo. 1. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012. p. 125..

O segundo texto é da coluna Sua lágrima de amor, com o título “Seja bela para seu marido”, publicado em 24 de agosto de 1954 e que convidava as leitoras do jornal Ultima Hora a escreverem para Suzana:

“Se você gosta de alguém; se não gosta de ninguém; se é feliz ou infeliz no amor – escreva para Suzana Flag. A novelista célebre de ‘Meu destino é pecar’ escreverá todos os dias em Ultima Hora, respondendo às nossas leitoras, de todas as idades e condições sociais. Suzana Flag estará sempre disposta a atender à mulher enamorada e a dar-lhe a palavra justa, amiga e clarividente, o conselho sábio que poderá decidir a sua crise sentimental.”

Grock

Nelson já trabalhava na imprensa há quase 20 anos quando se tornou um dramaturgo de sucesso com a peça Vestido de Noiva, escrita em 1943. Mesmo com a aclamação da crítica, o autor chegava a pedir aos amigos jornalistas que publicassem mais textos que divulgassem sua peça, e algumas vezes ele mesmo se encarregava de escrever para explicar ou enaltecer seu trabalho, conforme relatou em suas memórias:

“O êxito de Vestido de Noiva banhou em mel a minha vaidade, mas ao mesmo tempo me despertou para um problema: os admiradores são realmente nocivos para o artista. Naquele tempo eu ainda precisava do êxito, do artigo no jornal. Eu fazia qualquer coisa para ter artigo no jornal e escrevi muito artigo sobre mim mesmo, com pseudônimo”.[5]RODRIGUES, Sonia (Org.). Nelson Rodrigues por ele mesmo. 1. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012. p. 64.

Convicto de que o público precisava entender sua obra de uma forma que somente ele poderia explicar, passou a escrever sobre teatro sob o pseudônimo Grock, na coluna Spot-light, de O Cruzeiro. Grock também aparece na coluna Teatro, da revista A Cigarra, ambas as publicações do grupo Diários Associados.

Ruy Castro descreve na biografia O Anjo Pornográfico que:

“O talento de Nelson para reproduzir, repetir e disseminar qualquer elogio que lhe fizessem era do tamanho de seu gênio dramático. Mesmo que esse elogio tivesse de ser escrito por ele próprio. Uma de suas províncias era a influente coluna ‘Spot-light’ de ‘O Cruzeiro’, assinada por ‘Grock’ ou por Accioly Neto [...]. Durante mais de dez anos, a partir de 1944, todas as resenhas de peças de Nelson publicadas em ‘Spot-light’, assinadas por Accioly, foram escritas por Nelson.”[6]CASTRO, Ruy. O Anjo Pornográfico. São Paulo: Cia. das Letras, 2010. p. 211.

Selecionamos quatro textos de Grock publicados em A Cigarra, na coluna Teatro, que, conforme as evidências acima citadas, pela época e pelo estilo, foram escritos por Nelson Rodrigues.

No primeiro, o autor fala sobre a companhia Os Comediantes, que fará nova temporada de Vestido de Noiva e também encenará A mulher sem pecado, sua primeira peça, no Teatro Phoenix, no Rio de Janeiro. Afinal, os Comediantes. Página 117 do PDF.

Na segunda crônica, escrita em 1946, Grock descreve a força da voz da atriz polonesa Irena Stipinska, escalada para interpretar madame Clessy, na reestreia de Vestido de Noiva daquele ano. Stipinska ou uma voz do outro mundo. Páginas 144 e 151 do PDF.

Em maio de 1946 sua crônica fala sobre Bibi Ferreira. Grock exalta sua postura com atriz e sua garra em comandar o teatro Phoenix. O fenômeno Bibi Ferreira. Página 143 do PDF.

Em novembro de 1946, outra coluna assinada por Grock elogia a maturidade do público carioca em prestigiar peças do dramaturgo norte-americano Eugene O´Neill, uma evolução iniciada, segundo o autor, por grupos como Os Comediantes e autores como Nelson Rodrigues. Eugene O'Neill triunfante. Página 137 do PDF.