O futebol é uma das paixões do brasileiro. É um esporte que desde a sua chegada ao Brasil, lá nos finais do século XIX, encantou distintas classes sociais. A sua prática foi disseminada nas classes elitizadas e proliferou entre as classes mais empobrecidas, tornando-a, com o passar do tempo, significado de identidade para toda uma nação.
Como entender que um esporte como o futebol pôde se tornar um elemento na construção de nossa identidade nacional, principalmente quando falamos em eventos de destaque mundial, como a Copa do Mundo, as Olimpíadas, entre outros campeonatos mundiais?
Podemos entender a expressão identidade nacional a partir de uma definição mais abrangente, como conceito que “visa tornar homogêneas as diferenças que existem no interior da nação, estabelecendo um discurso de unidade; de um povo unificado em torno de ideais comuns”.¹
Desta maneira, “tornar homogêneas” as diferenças nem sempre significa fazer prevalecer a vontade de todo um país, mas sim de alguns segmentos da sociedade. Portanto, devemos entender o conceito de identidade nacional como uma construção histórica, localizada em um tempo e um espaço que sinalizam relações de poder no campo social, político e econômico.
Alguns períodos de nossa história mostram que esse sentimento de irmandade coletiva e de identificação com a pátria foi incentivado e construído pela mídia, e também pelos governos, como foi o caso da Copa de 1938 e de 1970.
A Copa de 1938, disputada na França, foi um evento de grande importância para firmar o futebol enquanto aliado do projeto de construção de uma unidade nacional proposto pelo Estado Novo (1937-1945). Devido a isso, pode-se perceber um esforço para construir a imagem de seleção nacional que despertasse sentimento de orgulho de ser brasileiro. Mesmo tendo o Brasil alcançado o terceiro lugar no campeonato, a mídia, em seus artigos e reportagens, teceu um discurso de caráter nacionalista que circulou e mobilizou tanto brasileiros quanto estrangeiros, contribuindo para reafirmar a idéia de uma delegação forte e disciplinada, com a função de mostrar o Brasil e o seu povo para o resto do mundo.
A conquista do tricampeonato em 1970 e, consequentemente, a da Taça Jules Rimet, fez da seleção brasileira uma referência mundial no quesito futebol. Reafirmou-se naquele momento o ser naturalmente “bom de bola”, refletindo a ginga, a flexibilidade e a esperteza do brasileiro.
Nesse momento em que o país tinha poucos motivos para se alegrar – por conta do período de Ditadura Militar no Brasil (1964-1985) –, Emílio Garrastazu Médici, então Presidente da República, soube utilizar muito bem a paixão dos brasileiros a favor de seu governo e ofereceu respaldo financeiro necessário para a seleção. Também associou o futebol com o governo ditatorial ao fazer a seguinte relação: disciplina e jogadores dispostos a defender a causa nacional como exemplos para os cidadãos.
Enquanto muitos eram presos, torturados e exilados, os propagandistas do regime entoavam: “noventa milhões em ação... É aquela corrente pra frente... Parece que todo Brasil deu a mão...”
Ainda que o futebol se relacione a algumas estratégias políticas durante alguns episódios de nossa história, sua riqueza também consiste em ser socialmente um esporte que proporciona momentos de descontração e confraternização: a pelada aos finais de semana, com os amigos e a partida no campinho de terra improvisado, com bola de meia e trave de bambu. O futebol desperta nos mais e nos menos acalorados um sentimento de irmandade coletiva, em que os fatores raciais, religiosos e sociais são pulverizados em meio ao sentimento de pertencer ao um time em específico ou de torcer pela seleção.
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¹ IDENTIDADE..., 2010..
² ESTRANGEIROS..., 1938, p. 10. Reportagem referente a vitória sobre a seleção polonesa..