Neste número, dedicado ao tema da gestão documental sistêmica, destacamos dois setores que podem ser considerados como “coração” do Departamento de Gestão do Sistema de Arquivos do Estado de São Paulo. São eles: o NATOS (Núcleo de Assistência Técnica aos Órgãos do Sistema) e o CCPE (Centro de Coordenação dos Protocolos Estaduais). Os trabalhos técnicos desenvolvidos pelas equipes que atuam nesse microcosmo do Arquivo ilustram muito bem a riqueza e complexidade de um arquivo público. Seguramente, algo ainda muito invisível a gestores e cidadãos
O lugar do NATOS e do CCPE na estrutura do APESP
O Sistema de Arquivos do Estado de São Paulo é composto pelos órgãos da administração direta e indireta do Poder Executivo do Estado, podendo ser composto também instituições de outras esferas do poder (Ministério Público, Defensoria Pública, órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário do Estado e Administrações Municipais), mediante convênios ou termos de cooperação técnica. Mecanismo administrativo que congrega cerca de 600 mil servidores[1] que são responsáveis por fazer girar a gigantesca máquina pública do estado de São Paulo. Estamos falando de algo que supera índices populacionais da esmagadora maioria de municípios paulistas[2].
Imaginemos que essa “máquina” está a produzir um fluxo de comunicação e de informações de dimensões absolutamente incalculáveis! Entretanto, parte desse fluxo possui uma dimensão material e, portanto, passível de mensuração, consubstanciado em toda “massa documental” produzida diariamente pelo Poder Executivo do Estado de São Paulo. Estamos falando de processos, expedientes, ofícios, memorandos, relatórios, enfim, inúmeros tipos documentais produzidos, tramitados e guardados em gavetas, sobre mesas, depósitos e também no surreal mundo virtual dos computadores e suas invisíveis redes. É disso que se trata!
Essa é a “matéria prima” sobre a qual trabalha a singela equipe de nove funcionários liderados por Bruna Attina, formada em ciências sociais.
"Entrei no Arquivo Público do Estado em dezembro de 2008, como diretora do Núcleo de Formação e Treinamento (NFT), mas na época não havia corpo técnico. Então, eu acabava participando da formulação de algumas tabelas de temporalidade de documentos de atividades-fim. Em 2012, apareceu a oportunidade de entrar no corpo diretor do NATOS, o que eu achei uma grande oportunidade, porque era o que eu mais gostava dentro do departamento, ter esse contato direto com os órgãos, prestar atendimento, participar de reuniões. Então, eu achei ótimo, fiquei muito feliz com essa chance de mudar de setor."
Assim, Bruna sintetiza as funções principais exercidas pelo Núcleo:
"NATOS é o Núcleo de Assistência Técnica aos Órgãos do SAESP. A função básica desse núcleo é prestar assistência a tudo que envolve a gestão documental, arquivos e acesso à informação. Prestamos esse atendimento durante as reuniões que realizamos, nas visitas técnicas, quando vamos aos órgãos, na promoção de palestras e treinamentos e por meio de telefone e e-mails. Fazemos isso para que os órgãos implementem essa política pública internamente."
Orientação técnica às repartições públicas
Para fazer funcionar esse gigantesco mecanismo sistêmico, a estratégia definida pelo Departamento de Gestão foi a interconexão com os arquivos existentes em cada órgão e a criação de instâncias estruturadas e colaborativas, chamadas de Comissões de Avaliação de Documentos e Acesso, conhecidas como CADA.
"As CADA instituídas são nossos braços nos órgãos. Primamos para que a orientação seja diretamente à comissão, para que ela dissemine esse conhecimento internamente.", afirma Bruna.
O esforço é, portanto, acionar e capacitar essa imensa rede para que ela atue nos seus respectivos órgãos como difusores e multiplicadores das atividades de gestão documental e de arquivo.
Para exercer esse complexo labor, a equipe do NATOS conta com Alexandre Bianchi, Alessandra Zorzetto, Eder Araujo, Sheila Juviniano, Joylline Almeida, Rosa Maria Rodrigues, Alexandre Pazine Silmara Vilalba, que participam de elaboração de planos de classificação e tabelas de temporalidade, prestam orientação técnica aos órgãos da Administração Pública, controlam a eliminação de documentos, auxiliam na instituição ou reestruturação das CADA e participam de projetos técnicos.
Alexandre Bianchi, executivo público, é o substituto imediato de Bruna. Graduado em História e Direito, há 5 anos trabalhando no mesmo setor, desde que entrou no Arquivo, ele fala das maiores dificuldades da equipe no trabalho de orientação às CADA:
"A administração pública é muito grande e complexa e não é fácil orientar e propor padronização em ambientes com práticas muito distintas. Hoje as Comissão estão ligadas diretamente ao gabinete da autoridade máxima dos órgãos da Administração mas nem sempre elas possuem o respaldo necessário para executar seu trabalho. Sem esse apoio a comissão tem pouco poder de transformação, de fazer com que as pessoas passem a agir conforme as normas da gestão documental. Quando o dirigente tem uma visão, participando de reuniões, percebe melhor e as coisas começam a se movimentar".
Nesse sentido, Bruna é enfática:
"Existem alguns cenários em que aparecem essas dificuldades. O primeiro é quando a comissão não está muito interessada no trabalho, ou não o compreende, então tem que fazer essa sensibilização, por meio de reuniões e palestras, quando mostramos a importância do trabalho e como esse trabalho vai trazer soluções para o dia a dia dos funcionários. O segundo é quando a CADA tem esse conhecimento e tenta aplicar no órgão, porém o dirigente não dá apoio e tende a paralisar o trabalho internamente. Neste caso, o coordenador do Arquivo Público realiza uma importante ação política junto a esses dirigentes. Infelizmente, a maioria das Comissões não é liberada para as atividades de gestão documental que ficam relegadas a segundo plano, quando muito".
O treinamento e a rotina da equipe do Núcleo de Assistência aos Órgãos do SAESP
Mas, como se dá a capacitação de funcionários do NATOS para que exerçam tão complexas funções, sendo que não há nenhuma instância formadora de profissionais voltada especificamente para esse tipo de especialidade? Bianchi assim explica:
"Não existe um manual de instruções. Primeiro, escolhemos algum material para ser lido, indicamos a legislação sobre arquivos, depois eles começam a acompanhar as reuniões conosco".
"Não é simples. Por exemplo, a atividade de orientar a elaboração da tabela de temporalidade de documentos das atividades-fim. Por conta da complexidade do trabalho, você percebe que há alguns servidores que têm mais interesse que outros. Então, vamos capacitando aos poucos, na prática do dia a dia. Não tem outra forma de aprender a não ser indo nas reuniões, analisando documentos, produzindo pareceres técnicos, fazendo na prática", completa Bruna.
Perguntamos aos nossos dois entrevistados: quais os maiores desafios que vocês enxergam para o NATOS?
"Recebemos telefonemas de pessoas da administração pública querendo alguma orientação, como eliminar, como classificar determinado documento, onde encontrar tabelas. Questões simples respondemos por telefone ou fornecemos o contato do coordenador da comissão, dentro do órgão. Há órgãos espalhados no estado inteiro, como Secretaria da Segurança Pública, Secretaria da Saúde e Secretaria da Educação, então às vezes alguns servidores, lá na ponta, desconhecem a existência da comissão. Explicamos a existência da comissão e colocamos em contato com o coordenador para que eles sejam orientados". Mas, o nosso desafio maior é estabelecer essa imensa rede de multiplicadores, capacitá-la e orientá-la para elaboração dos instrumentos de gestão e implementar a política arquivística, expressa Bianchi.
Como o leitor pode ver, trata-se de uma missão socialmente muito importante, mas pouco visível para os cidadãos que, de uma maneira geral, sequer conhecem os arquivos.
Nesse sentido, Bruna assim se manifesta:
"O trabalho desenvolvido pelo NATOS tem reflexos na transparência e eficiência do serviço público. Além disso, é o núcleo que inicia e desencadeia a formação do patrimônio documental que revela os aspectos da história e da memória que hoje está no Arquivo. Orientamos melhor os funcionários sobre como produzir a documentação, aplicar os instrumentos de gestão e se sensibilizar com o patrimônio documental. Dessa forma, a gente vai conseguir com que essa documentação seja encaminhada para o arquivo intermediário e para o arquivo permanente devidamente tratada e protegida".
Esse depoimento conjunto só nos faz ter certeza do potencial que tem o serviço público em prestar um atendimento de excelência aos usuários e cidadãos. Nesse sentido, Bianchi comenta:
"Não escondo a minha satisfação no meu trabalho, por mais que haja pouca gente disponível, devido aos recursos. Nós ajudamos muita gente a transformar a realidade que eles vivem, por meio do tratamento aos documentos públicos. Muitos não sabem o que fazer com esses documentos. Em alguns encontros e reuniões a gente aponta um caminho, e se este for seguido, torna-se um procedimento interno no órgão. Percebendo as vantagens da gestão documental, a nossa orientação é sempre necessária, porque sabemos que os órgãos precisam bastante dela. Fazendo este trabalho a gente se sente satisfeito por atender o que deles necessitam. Nunca deixaremos um órgão sem resposta e sem orientação necessária para realização desse trabalho."