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Os sujeitos fora do discurso

Vistos como meros coadjuvantes ou quase não lembrados nos discursos pós-movimento, cabe destacar o papel que alguns atores sociais tiveram no processo.

A participação feminina foi intensa. As senhoras da “alta sociedade” se envolveram profundamente no movimento e dirigiam os grupos assistenciais que auxiliavam no esforço de guerra. Nos meios de comunicação da época, elas eram comparadas às “esposas dos bandeirantes”, instigando seus maridos à batalha e não aceitando a derrota.

É interessante observar que o Movimento de 32 contribuiu enormemente para uma série de mudanças que já se esboçavam naquele momento em que o espaço da cidade ainda era basicamente masculino. Em termos sociais, os locais abertos não eram considerados “lugar” para mulheres “de bem” frequentarem desacompanhadas e o trabalho fora de casa, de maneira geral, era visto como espaço masculino, mesmo havendo um número considerável de mulheres que trabalhavam fora, como as da classe operária. No campo da política, o voto feminino ainda não era um consenso. Naquele momento em que a cidade se transformou e tudo girava em torno do conflito, os espaços tiveram que se abrir para as mulheres, que praticamente cuidaram de todo o esforço na retaguarda.

Elas eram as cozinheiras, costureiras, coletoras de donativos e propagandistas. As moças solteiras e as viúvas recebiam treinamento introdutório de enfermagem e eram encaminhadas para os hospitais e postos de emergência nas frentes de batalha. Tiveram também grande participação em linhas de produção de material bélico, como na embalagem de munição e acabamento de capacetes.

Ainda que muito ligadas à elite paulistana, as consequências dessa situação podem ser percebidas na figura de Carlota Pereira de Queiroz, médica que dirigiu o Departamento de Assistência aos Feridos (DAF) e, muito devido ao sucesso nessas atividades, se tornou a primeira mulher brasileira a ser eleita Deputada Federal, participar da Assembleia Constituinte e assinar uma Constituição Brasileira. Havia ainda mulheres que empunharam armas e combateram lado a lado com os soldados nas trincheiras.

Outro grupo a ser citado é o dos negros, que participaram ativamente do conflito. A maioria se concentrou em batalhões específicos chamados de “Legião Negra”. Era uma situação estranha em um conflito imerso nos ideais de uma elite que ainda colocava o negro numa condição de inferioridade.

Passavam por situações de discriminação, pois eram os primeiros a ser mandados para a batalha, sofriam com a qualidade da ração[*1] recebida e dificilmente eram incluídos nas linhas de comando – nos batalhões de soldados negros os comandantes eram quase todos brancos. Entretanto, eles participaram ativamente, e de forma organizada, de todo o movimento e em todas as áreas – dos campos de batalha às iniciativas médicas e assistenciais – nas quais muitas vezes criaram suas próprias associações.

Outro exemplo das discriminações sofridas foi o fato de que, enquanto, após o conflito, muitos ex-combatentes conseguiram indenizações, poucos foram os negros que tiveram seus pedidos de concessão de benefícios atendidos.

Porém, é preciso reconhecer que, mesmo não tendo essa intenção, o Movimento de 32 acabou dando visibilidade pública a esses grupos e se tornou um momento importante para que esses atores pudessem ser reconhecidos posteriormente como sujeitos ativos e participantes dentro do contexto da época.

Arquivo Público do Estado de São Paulo