Denise de Almeida Silva[*]
Resumo:
O presente texto apresenta o Sistema de Gerenciamento de Acervos do Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo, suas funcionalidades internas na descrição dos documentos e sua utilização pelos pesquisadores. Foi a partir do desenvolvimento do sistema que, em 2010, o processamento de documentos foi facilitado e, consequentemente, o número de acesso aos documentos e o número de pesquisadores aumentaram. Para os pesquisadores a ferramenta tecnológica possibilitou o amplo acesso ao acervo e também novas possibilidades de realizar a pesquisa; ao mesmo tempo, dúvidas relacionadas a reprodução de documentos e uso de documentos digitalizados são recorrentes. A intermediação entre o sistema e o acervo ressalta a importância dos profissionais de arquivos.
Palavras-chave:Sistema de Gerenciamento de Acervos; Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros; pesquisadores.
Abstract:
The following essay presents the Collections Management System of the Institute for Brazilian Studies Archive, of the University of São Paulo, showing its internal functionalities in documents description and its use by researchers. It was through the system’s development that, in 2010, document processing was facilitated and, consequently, the number of access to documents and of researchers increased. For these, the technological tool made possible a broader access to the collection, and also new possibilities to carry out their research. At the same time, doubts related to the reproduction of documents and usage of scanned documents are recurrent. The intermediation between the system and the collection underscores the importance of archival professionals.
Keywords: Collections Management System; Institute for Brazilian Studies Archive; researchers.
1. O Acervo
O acervo do Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (Arquivo IEB/USP) é constituído por fundos pessoais, coleções e documentação resultante de pesquisa, que são doados ou comprados pela instituição. A primeira coleção foi incorporada em 1962, sendo seu titular Yan de Almeida Prado; e a primeira aquisição de um fundo foi em 1968, o de Mário de Andrade.
Atualmente o acervo conta com 48 fundos, 63 coleções e 39 conjuntos de documentação resultante de pesquisa, em diferentes etapas de descrição. O processamento mais sucinto, que também pode ser chamado de pré-classificação é a identificação nas etiquetas das caixas de acondicionamento de tipos documentais e funções. A descrição mais completa é aquela que identifica e descreve a unidade documental.
Os últimos fundos pessoais incorporados foram os de Aracy Abreu Amaral, Ivan Lins, Gilda de Mello e Souza e Antônio Cândido, sendo os dois últimos no ano de 2017. Todos os conjuntos documentais encontram-se em processo de descrição, sendo que o primeiro teve sua conclusão em janeiro de 2018.
A forma de acesso aos documentos por pesquisadores externos à instituição foi iniciada no ano de 2006, com a direção da professora Ana Lúcia Duarte Lanna. Até então, o acesso aos documentos era prioritariamente reservado aos pesquisadores da casa, conforme Ata do Conselho Administrativo da instituição, do ano de 1974[1] ; pesquisadores externos tinham acesso aos documentos pelos instrumentos de pesquisa fruto de projetos de professores, que obedeciam aos recortes relacionados ao objeto estudado.
Retomando-se o ano de 2006, foi o momento em que professores e pesquisadores de universidades brasileiras comprometeram-se com a adoção de uma política comum de acesso irrestrito aos acervos de escritores, artistas e intelectuais, em documento assinado em 27 de novembro de 2006[2]
Ao final da gestão da professora Ana Lúcia Duarte Lanna, em 2010, o Arquivo havia sido reestruturado e as divisões existentes foram centralizadas; ao mesmo tempo foi desenvolvido o Sistema de Gerenciamento de Acervos (SGA), que uniu em um único instrumento eletrônico e on-line, informações sobre todos os fundos, coleções e DRPs existentes. Esta ferramenta tecnológica foi produto da implementação da política de acesso irrestrito aos documentos, carregando o valor simbólico de democratização à pesquisa, por modificar uma tradição existente, e por ser de fácil acesso e uso a todo e qualquer pesquisador.
Apresentado o contexto de desenvolvimento do SGA, este texto se deterá a descrever o sistema, de forma a legitimá-lo como ferramenta potencializadora do acesso irrestrito aos documentos, e analisar o seu uso pelo pesquisador no cotidiano das atividades da Sala Consulta, não perdendo de vista o importante papel desempenhado pelos profissionais da área dos Arquivos, tanto no processo de descrição dos documentos, quanto no apoio a pesquisa.
2. O Sistema de Gerenciamento de Acervos (SGA)
Até o ano de 2009 o acesso dos pesquisadores aos documentos do Arquivo do IEB/USP era feito pelos instrumentos de pesquisa existentes, dentre eles o guia do IEB, as cronologias estratificadas, os catálogos e banco de dados individualizados, ou seja, cada fundo, coleção ou mesmo séries documentais tinham os seus instrumentos. Contudo nem todos os fundos possuíam instrumentos de pesquisa, priorizando-se aqueles que eram objetos da pesquisa de professores da casa, que desenvolviam projetos que previam a elaboração de instrumento de pesquisa. Os resultados desses trabalhos eram colocados à disposição do pesquisador, neste sentido “(...) explorando o potencial de estudo gerado por essas fontes primárias, a pesquisa desvenda o conteúdo do acervo, ao mesmo tempo que realiza uma catalogação acurada, pronta para o uso de novos estudiosos.” (BATISTA, 1997, p. 8).
O desenvolvimento do SGA, na linguagem SQL-SERVER, em 2009, possibilitou que os múltiplos instrumentos de pesquisa, elaborados desde a década de 1960, fossem consolidados em um único instrumento, eletrônico e on-line. Para os pesquisadores externos, em sua grande maioria de perfil acadêmico, foi possibilitada uma nova forma de realizar seus trabalhos, pois o sistema permitiu realizar a tradicional busca por fundo ou tipologia documental, como também a pesquisa transversal dos conjuntos documentais por palavra-chave, data, nome de pessoa/instituição. O SGA promoveu uma nova forma dos pesquisadores tomarem contato com a documentação existente no Arquivo IEB/USP, menos direcionada pelos instrumentos até então existentes, tornando amplo acesso aos documentos e possibilitando rastrear por todos os conjuntos documentais os temas de pesquisa, as tipologias documentais, os registros existentes em determinados períodos, e nomes de pessoas e instituições presentes, realizando uma grande varredura em todos os documentos descritos no sistema.
O SGA foi idealizado por Elisabete Marin Ribas e Frederico Antonio Camillo Camargo, com apoio da direção do Instituto. Como ressalta Elisabete, o sistema teve a particularidade de ser desenvolvido por um profissional da informática que também entendia as questões do acervo e este mesmo profissional vivenciou a rotina das atividades do Arquivo IEB/USP: “(...)o programador foi alocado dentro do próprio Arquivo, acompanhando, diariamente os processos internos do setor, a fim de transplantá-los para a linguagem do computador.” (RIBAS, 2013, p.102). Além dos instrumentos encadernados, Elisabete Marin Ribas, relata que conjuntos documentais como os de Pierre Monbeig, a Correspondência de Mário de Andrade, Anita Malfatti, Ernani Silva Bruno e a Correspondência de Aracy de Carvalho Guimarães Rosa contavam com base de dados resultantes de projetos de pesquisa e que apesar de minuciosamente construídas de acordo com as particularidades do titular:
(...) a multiplicação de bases para o Arquivo acarreta num problema óbvio: o consulente é obrigado a realizar buscas individuais em cada um desses instrumentos de pesquisa caso seu interesse extrapole as especificidades dos conjuntos documentais que cada um deles, em si, engloba (RIBAS, 2013, p. 101).
Considerando o contexto do processamento documental e da pesquisa, o SGA foi projetado para conter basicamente duas interfaces: a que vai para o catálogo eletrônico disponibilizado no site da instituição e que também é usada no atendimento ao pesquisador; e a de gerenciamento das atividades com os documentos do acervo, e que possui funcionalidades distintas, dependendo do perfil do usuário. Posteriormente foi desenvolvida uma terceira interface, dedicada a consulta presencial.
Na edição de 2010 do “Guia do IEB: o acervo do Instituto de Estudos Brasileiros”, há uma parte dedicada ao SGA, em que se destaca:
Tecnologicamente, a construção do catálogo eletrônico exigiu a modelagem e implementação de um banco de dados relacional para o armazenamento das informações dos acervos, unidades constitutivas e seus agrupamentos, e de uma aplicação web que constituísse o front-end desse banco de dados dividido em dois módulos: a) o módulo de manutenção e gerenciamento de acervos, de uso interno; b) módulo de consulta, para ser disponibilizado aos consulentes via internet (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, 2010, p.49).
Na sua utilização na Sala de Consulta o SGA permite para o consulente o cadastro, a pesquisa, a solicitação de documentos e acesso aos documentos que se encontram digitalizados, além de manter um histórico de pesquisa que pode ser acessado em qualquer momento. Para os atendentes o sistema possibilita visualizar os pedidos de documentos, relacionando-os a forma de acondicionamento e sua localização, como também o acompanhamento dos documentos que são acessados pelos consulentes.
Na interface voltada para o gerenciamento interno dos documentos de arquivo, as principais funcionalidades do SGA são: processamento documental; controle da saída de documentos para exposições e restauro; elaboração de relatório de consulentes; histórico de consulta dos documentos; e contabilização diária de documentos descritos e documentos pesquisados
3. A descrição documental no SGA como potencializadora do acesso
A configuração do SGA facilita o processamento de documentos por não haver obrigatoriedade de preenchimento de todos os campos e também por ter padronizadas as tipologias documentais, possuir vocabulário controlado e referências onomásticas e índices de pessoas e localidades previamente cadastrados. Para o campo das datas o sistema permite colocar data completa ou apenas ano, como também data presumida, ou ainda, não colocar data. O campo “nota de pesquisa” permite que sejam colocadas informações de onde foram coletadas informações que contribuem para contextualização do documento, por exemplo.
Para cada documento descrito é atribuído um código que funciona como o “RG” do documento. Nenhum outro documento terá o mesmo código no universo atual de 500 mil documentos do acervo do Arquivo IEB/USP. O código é atrelado a unidade de acondicionamento e esta fica relacionada ao mobiliário do acervo, especialmente no caso das mapotecas. Por este código o documento também pode ser relacionado a outros documentos descritos, evidenciando as relações que os documentos de arquivo possuem entre si. Para Menne-Haritz (1999) é na relação do documento de arquivo com os outros documentos que se encontra o valor probatório, pois funções são explicitadas fora do documento. Por esta percepção, é possível inferir que o documento de arquivo é prova, principalmente, de algo externo a ele, que se traduz na atividade ao qual está relacionado.
A otimização do processo de descrição, que ocorre na interface interna do SGA, além de promover o acesso aos documentos do acervo, que se dá na interface voltada par pesquisa, repercute diretamente nos números de documentos consultados e números de pesquisadores na sala de consulta. Na tabela abaixo, estão os dados que demonstram a evolução do processamento de documentos e do número de documentos consultados e consulentes atendidos:
2010 | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | 2017 | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Processamento documental |
57.289 | 71.065 | 89.769 | 92.975 | 120.287 | 123.876 | 128.751 | 137.545 |
Consulentes | 166 | 162 | 243 | 236 | 113 | 165 | 223 | 258 |
Documentos |
2.815 | 2.668 | 9.862 | 11.197 | 8.227 | 10.011 | 15.320 | 22.444 |
4. O uso do SGA pelos pesquisadores
O catálogo disponibilizado no site do IEB (www.ieb.usp.br) permite que as pessoas verifiquem se os documentos que buscam se encontram no Arquivo-IEB/USP sem a necessidade do deslocamento físico. Encontrados os registros, muitas vezes a descrição on-line atende as necessidades dos usuários, em outros casos, se necessária a consulta aos originais, o pesquisador já terá em mãos os códigos dos documentos que procura, otimizando o tempo de pesquisa na sala de consulta.
Dos fundos/coleções que não estão no Catálogo Eletrônico, no site do IEB o pesquisador pode consultar o guia dos acervos digitalizado e também notícias sobre a incorporação de novos acervos. Independentemente do estágio de processamento, a partir do momento que acervos são incorporados pelo Arquivo IEB/USP, todos os documentos podem ser acessados. Aquilo que irá variar é o tempo para o pesquisador encontrar aquilo que busca, uma vez que utilizando o SGA, fará com exatidão seu pedido de consulta, diferente de ter que percorrer as caixas do acervo, por mais que tenham a relação dos tipos documentais e funções descritas em suas etiquetas.
Durante o atendimento presencial é pelo SGA que o pesquisador faz seu cadastro para a consulta aos documentos. Ao finalizar esse passo o sistema o leva para a interface do catálogo que está on-line, mas agora com a possibilidade de selecionar os documentos que pretende pesquisar. Neste momento o sistema funciona como um carrinho de compras da Internet: à medida que o pesquisador seleciona os documentos, eles são armazenados em “documentos selecionados”, ao concluir a seleção, a relação de documentos segue para os atendentes que pegarão no acervo as caixas correspondentes, ou no caso de grandes formatos, buscarão os documentos nas mapotecas. Caso o documento esteja digitalizado, o pesquisador terá acesso imediato, não precisando concluir a seleção, pois o próprio sistema já terá contabilizado seu acesso ao registro. Os documentos vistos pelos pesquisadores, sendo originais ou digitalizados, ficam registrados no histórico de pesquisa individual dentro do SGA.
Na escolha dos documentos que pretende analisar, o pesquisador também pode se deparar com uma lista de documentos, mostrada pelo SGA, e que estão relacionados a aqueles que ela já selecionou. O SGA permite no processo de descrição dos documentos que estes sejam relacionados, evidenciando para os pesquisadores aquilo que caracteriza o documento de arquivos: as relações que os documentos de arquivo possuem uns com os outros e seu contexto de produção.
5. As dúvidas dos pesquisadores na interação com o SGA
A particularidade do Arquivo-IEB/USP em tratar de acervos privados de interesse público gera distintas interpretações quanto ao uso que se faz dos documentos. Uma vez diante de um documento original ou digitalizado, algumas dúvidas mostram-se recorrentes e estão compartilhadas aqui:
Para as questões de reprodução de documentos que estão presentes diariamente no atendimento ao pesquisador, há o conhecimento da Lei de Direitos Autorais (Lei no. 9610/98) pelos atendentes e que é repassada ao pesquisador em seus questionamentos, porém o pedido de reprodução deve ser avaliado documento a documento. A consulta a esses documentos é livre, isto é, todo documento pode ser acessado, mas a utilização das informações e a reprodução obedecem à Lei dos Direitos Autorais. Os detentores dos Direitos Autorais, salvo autores falecidos há 70 anos ou mais, são os próprios autores (se vivos), seus familiares, ou pessoas físicas ou jurídicas devidamente autorizadas pelos titulares.
Questões que se vinculam à lei de Direitos Autorais e que se mostram recorrentes pelo fato do SGA possuir imagens digitalizadas dos documentos na interface da Sala de Consulta são: sobre as imagens dos documentos não aparecerem no catálogo disponibilizado no site da instituição e a ideia de que aquilo que está digitalizado está público. Ambas as dúvidas perpassam por explicações sobre as permissões de reprodução da Lei de Direitos Autorais e a conservação de documentos. Se o titular não está em domínio público, se não há autorização do titular ou herdeiros, se o documento não tem caráter público, a instituição não pode colocar imagens de documentos na Internet. Se documentos foram digitalizados devido ao estado avançado de deterioração ou que são solicitados com muita frequência, isso não quer dizer que ele se tornou público. A digitalização foi adotada como medida preventiva e obedece aos mesmos critérios colocados pela lei de Direitos Autorais.
Assim, não se pode fornecer cópia de documentos digitalizados apenas por esta característica. Como também, não é permitido ao pesquisador fazer imagens da tela do computador que exibe documentos digitalizados. Por isso, há um grande investimento por parte dos atendentes junto ao pesquisador em explicar que todos os documentos custodiados pelo Arquivo-IEB/USP são protegidos pela Lei de Direitos Autorais. Deste modo, sejam as pesquisas de finalidade acadêmica ou comercial, há necessidade da autorização registrada do titular do fundo ou de seus herdeiros para a reprodução dos documentos. Essa autorização só não é necessária para acervos que estão em domínio público, ou seja, passados 70 anos da morte do titular; documentos em que o titular exerce uma função pública e documentos já publicados, como por exemplo artigos de periódico e jornais, folhetos e programas.
Como o SGA possui documentos digitalizados que podem ter cópias fornecidas aos pesquisadores, percebeu-se que os mesmos faziam pedidos de um grande número de imagens, mesmo que não fossem utilizadas na totalidade. Por isso, no ano de 2017 foi instituída a cobrança de R$ 1,00 por imagem para a solicitação de reprodução com finalidade acadêmica para os documentos permitidos. A arrecadação, além de subsidiar a permanência de estagiário para a equipe do atendimento, permitiu que pesquisadores priorizassem seus pedidos, não fazendo grandes solicitações que acabavam onerando o tempo de trabalho da equipe do Arquivo-IEB/USP. De toda forma, a reprodução de documentos permitidos, pode ser realizada na Sala de Consulta pelos pesquisadores com equipamento próprio, novamente obedecendo-se a legislação vigente.
Para todos os documentos reproduzidos é assinado pelo pesquisador o “Termo de uso dos documentos do Arquivo-IEB/USP” pelo qual ele se torna responsável pelo uso que fará dos documentos que reproduziu e que estão elencados no termo.
O SGA também comporta documentos sonoros, audiovisuais e fotografias. Muitas vezes os pesquisadores entendem que pelo fato de uma música estar digitalizada, ou então, por uma fotografia da década de 30 ter sido digitalizada, que eles podem ter a cópia digital dos documentos que necessitam para sua pesquisa. Mais uma vez é necessário que os atendentes enfatizem que a mudança de suporte e a facilidade em ter acesso aos documentos por uma ferramenta tecnológica não implica em deixar de lado o Direito de Imagem, estabelecido como um direito de personalidade estabelecido pelo Código Civil (VALENTE, 2017, p.26), e os Direitos Conexos, que são relativos aos direitos de artistas intérpretes ou executantes, produtores fonográficos e empresas de radiodifusão:
Esses detentores de direitos não são autores e não criam obras originais; os intérpretes de uma canção, por exemplo, estão interpretando uma canção de um autor; a partir do momento que passam a ser gravados, transmitidos pela rádio e fonogramas passam a ser vendidos, reivindicaram uma compensação por sua interpretação (VALENTE, 2017, p. 35).
6. Acesso aos documentos pelos pesquisadores: interação entre o sistema e a profissional da área de Arquivos
Diante da ferramenta tecnológica que se tornou a porte da entrada para os conjuntos documentais do Arquivo IEB/USP, a partir de 2010 até os dias atuais, um trabalho cuidadoso com as equipes que descrevem documentos e com a equipe que atende os pesquisadores é realizado.
Treinamentos periódicos são ministrados para que se realize descrição dos documentos. Em encontros de formação, que ocorrem uma vez por semana, são discutidas questões da área de arquivos que vão desde a higienização dos documentos, políticas de incorporação de acervos, reprodução de documentos, formas de utilização do SGA. Profissionais especializados são convidados para conversar com toda a equipe, promovendo troca de experiências que levam a melhoria da qualidade dos serviços do Arquivo.
Para o entendimento do que é o documento de arquivo a fim de que esse conhecimento seja compartilhado com os pesquisadores, buscando fornece-lhes ferramentas que promovam o entendimento de como os documentos são acumulados, tem-se que:
Como resultado natural e necessário do processo que lhes deu origem, os documentos de arquivo obedecem a uma lógica puramente instrumental, ligada às demandas imediatas do ente produtor. Dessa condição decorrem postulados que afetam, de modo similar, arquivos de instituições e pessoas: a necessidade de preservar a integridade do fundo e o sistema de relações que os documentos mantêm entre si e com o todo; o respeito à proveniência; a primazia do contexto sobre o conteúdo (ou do valor probatório sobre o valor informativo), nas operações de arranjo e descrição; e a impermeabilidade do arquivo em face de seu uso secundário (CAMARGO, 2009, p. 29).
A base conceitual dos atendentes é determinante para que na Sala de Consulta os pesquisadores usufruam em plenitude do SGA. É na utilização do SGA como intermediador entre o pesquisador e o acervo, que os profissionais do Arquivo, podem contribuir com a pesquisa realizada informando sobre as caraterísticas dos documentos de arquivo, a importância do contexto de acumulação dos documentos e as relações que os documentos possuem entre si e também com documentos de titulares distintos.
Além disso, os atendentes são responsáveis por dirimir dúvidas, especialmente vinculadas aos documentos digitalizados, que o uso de ferramentas tecnológicas não implica, necessariamente, em resoluções destes questionamentos.
Considerações
Dentro de um contexto de mudanças administrativas e culturais do Instituto de Estudos Brasileiros, o SGA possibilitou o processamento de documentos em massa e o amplo acesso aos documentos do Arquivo do IEB-USP, modificando a forma de pesquisar até então vigente, direcionada pelas tipologias documentais ou pelos instrumentos de pesquisa disponíveis. Essa ferramenta tecnológica foi desenvolvida num momento que em a democratização do acesso aos documentos era o norteador das discussões institucionais.
Facultar o acesso aos documentos por meio de ferramentas tecnológicas foi opção escolhida pelo Arquivo-IEB/USP, para transformar uma tradição de acesso aos documentos existente. Desenvolvido o sistema, investiu-se na formação dos profissionais do Arquivo uma vez que estes são fundamentais para que o pesquisador tenha o entendimento sobre o que é o documento de arquivo, as relações que os documentos possuem entre si e a importância de se entender o contexto de acumulação dos documentos, além de dirimir dúvidas impostas pela própria tecnologia, como as colocadas pela reprodução de documentos.
O fato do Arquivo-IEB/USP ser constituído por arquivos de pessoas e, por isso, obedecer a Lei de Direitos Autorais e Direito de Imagem, no tocante à reprodução de documentos, configura para profissionais do Arquivo-IEB/USP a devida orientação aos pesquisadores sobre as leis vigentes e que não cessam com a utilização da ferramenta tecnológica, como também pelo uso do SGA, pois no trabalho cotidiano com os pesquisadores, entende-se que é na interação entre tecnologia e o conhecimento dos profissionais do Arquivo-IEB/USP, que o acesso aos documentos pelos pesquisadores é potencializado.
Notas
- [*] Atua profissionalmente no Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo. Mestre em Ciência da Informação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Graduada em História pela Universidade de São Paulo. e-mail: das@usp.br
- [1]Sobre o acesso aos documentos: “3. Utilização: 3.1 Os documentos que constituem o setor de Arquivos do IEB estão abertos à consulta de professores, pesquisadores, especialistas e interessados, desde que devidamente credenciados e ressalvadas as condições impostas pelos depositários de Coleções ou pela Diretoria do IEB, ouvido o Conselho de Administração. 3.2 O pesquisador poderá requerer do conselho de Administração do Instituto a prioridade de consulta de determinado material, estabelecido, nesse caso, um prazo de execução da pesquisa e divulgação dos resultados. 3.3 A obtenção de cópias parciais ou totais depende da autorização do Conselho de Administração do IEB, observado o seguinte: 1º expressa indicação da fonte: 2º direitos autorais, se ainda vigentes, cabendo, nesse caso, consulta a ser feita aos herdeiros pelo IEB; 3º prioridade de divulgação total do documento pelo IEB, independentemente ou em co-edição. 3.4 Os Arquivos só poderão ser visitados com expressa autorização da Diretoria do IEB, cabendo a cada consulente conhecê-lo pelo catálogo ou por descrição do responsável imediato. 3.5 A quantidade de documentos a ser usada durante a pesquisa fica a critério do responsável imediato de setor. 3.6 Enquanto não estiverem terminados os trabalhos de catalogação, a consulta de interessados estranhos ao IEB deverá ser feita sob a orientação de um pesquisador deste instituto, perante a área de interesse da pesquisa. 3.7 Conforme entendimentos com a família Mário de Andrade, é prioridade do IEB a preparação da edição crítica das obras de Mário de Andrade, sujeita a planejamento geral do Conselho de Administração, que deverá compor uma comissão especial para esta finalidade”. (Arquivo-IEB/USP, Fundo IEB, código de referência: IEB-001-01-0073).
- [2] Transcrição do documento assinado em 27 de novembro de 2006, publicado posteriormente no Guia do IEB, em 2010: “... os pesquisadores abaixo-assinados comprometem-se a adotar como política comum a permissão de acesso irrestrito à documentação existente em acervos de escritores, artistas e intelectuais, sob guarda de instituições de pesquisa e ensino, como forma de democratizar a produção de conhecimento e preservar a memória intelectual do país”. (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, 2010, p. 31).
- [3]
- [4]
Bibliografia
- BATISTA, M. R. ABC do IEB: Guia Geral do Acervo. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1997.
- CAMARGO, A. M. Arquivos pessoais são arquivos. Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte: Minas Gerais. Disponível em: <http:// www.siaapm.cultura.mg.gov.br/ acervo/ rapm_pdf/ 2009-2-A02.pdf> Acesso em: 26 mar. 2018.
- MENNE-HARITZ, A. Thoughts on the latency of time in administrative work and the role archives play to make it visible. Tradução do artigo Die Verwaltung und ihre Archive. Überlegungen zur Latenz von Zeit in der Verwaltungsarbeit in: Verwaltung & Management, v.5,p.4-10,1/1999. Disponível em: <http:// www.staff.uni-marburg.de/ ~mennehar/ publikationen/ latency.pdf>.Acesso em: 20 ago. 2008
- RIBAS, E. M. O Sistema de Gerenciamento de Acervos do IEB USP. Seminário Internacional de Arquivos de Museus e Pesquisa: Tecnologia, informação e acesso. São Paulo, Brasil, 16 a 17 de novembro de 2011. São Paulo: Grupo de Trabalho Arquivos de Museus e Pesquisa, 2013; 99-105.
- UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Instituto de Estudos Brasileiros. Guia do IEB: o acervo do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo: Instituto de Estudos Brasileiros, 2010.
- VALENTE, M. G. Manual de direito autoral para museus, arquivos e bibliotecas [recurso eletrônico]. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2017. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/19038/Manual%20de%20direito%20autoral%20para%20museus%2c%20arquivos%20e%20bibliotecas.pdf?sequence=1&isAllowed=y Acesso em: 26 mar. 2018.